Avanços da Educação Financeira no Brasil e seus reflexos futuros

04/03/2022

Por: Reinaldo Domingos Os tempos estão mudando para melhor, lembro que quando iniciamos nossos trabalhos com a Educação Financeira no início dos anos 2000, pouquíssimas pessoas falavam sobre esse tema e a confusão com finanças pessoais era inevitável. Na época todos pensavam apenas em número e planilhas, mas de lá para cá muita coisa mudou, […]


Por: Reinaldo Domingos

Os tempos estão mudando para melhor, lembro que quando iniciamos nossos trabalhos com a Educação Financeira no início dos anos 2000, pouquíssimas pessoas falavam sobre esse tema e a confusão com finanças pessoais era inevitável. Na época todos pensavam apenas em número e planilhas, mas de lá para cá muita coisa mudou, graças a muito esforço e luta de profissionais que acreditaram na Educação Financeira.

Agora vivemos uma realidade muito gratificante, no qual a Educação Financeira já é uma realidade em diversos setores, como me alegro a constatar ao ver que o Governo Federal, por meio do Ministério da Educação (MEC), em parceria com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), criou um Programa Educação Financeira nas Escolas, buscando capacitar professores em Educação Financeira, para que o tema esteja presente nas salas de aula.

Também vejo um movimento muito forte sobre o tema com o início das aulas em 2021 da primeira graduação do país em Educação Financeira, uma iniciativa da Unoeste, com a empresa de educação DSOP Educação Financeira. Antes disso já existiam cursos variados sobre o tema, como pós-graduações, mestrados e doutorados.

Desde o ano de 2020 a educação financeira no ensino básico brasileiro se tornou obrigatória conforme a Base Nacional Comum Curricular – BNCC,  são muitas  conquistas e o debate sobre o tema se faz cada dia mais presentes em diversos veículos de comunicação. 

A Educação Financeira por se tratar de uma ciência humana deverá impactar de forma definitiva e consolidada nos próximos 10 a 20 anos visto que ela passa também por entendimentos novos e que ainda são pouco compreendidos. Constato isso por meio de meu conhecimento de estudos acadêmicos científicos.

Só podemos ensinar e aculturar uma sociedade se tivermos professores devidamente empoderados sobre essa ciência, e é exatamente aqui que quero manifestar que a iniciativa da CVM e de órgãos financeiros devem buscar por metodologias comprovadas de embasamento comportamental e não explicitamente financeiros.

Ensinar finanças pessoais promovendo poupança com rentabilidade nos ganhos, conhecimento de produtos financeiros, riscos etc., não foi ao longo dos últimos 30 anos eficaz na cultura financeira de dezenas de milhões de famílias brasileiras desequilibradas e não sustentáveis financeiramente.

Hoje felizmente o Brasil é um parceiro-chave da OCDE, com a qual mantém uma cooperação desde início dos anos 1990. Como tal, o país tem a possibilidade de participar dos diferentes órgãos, aderir aos instrumentos legais, se integrar aos informes estatísticos e revisões por pares de setores específicos. Atualmente, a nossa academia utiliza destes conhecimentos para seus artigos, dissertações e teses, sendo o principal deles o princípio da Educação Financeira.

Segundo a OCDE (2005), Educação Financeira é “o processo mediante o qual os indivíduos e as sociedades melhoram a sua compreensão em relação aos conceitos e produtos financeiros, de maneira que, com informação, formação e orientação, possam desenvolver os valores e as competências necessários para se tornarem mais conscientes das oportunidades e riscos neles envolvidos e, então, poderem fazer escolhas bem-informadas, saber onde procurar ajuda e adotar outras ações que melhorem o seu bem-estar.

Assim, podem contribuir de modo mais consistente para a formação de indivíduos e sociedades responsáveis, comprometidos com o futuro. Diante do exposto, como representante dos profissionais da Educação Financeira no Brasil, entendo que este princípio ainda não retrata por completo a verdadeira realidade e essência do propósito da Educação Financeira.

Nesse ponto é importante abrir um parêntese, pois acredito veemente que os ensinamentos embasados nesse conceito da OCDE trazem riscos financeiros. Assim, o resultado a médio prazo será o mesmo que já conhecemos, visto que ao impulsionar o consumo, mostrando a potencialização do dinheiro por ganho de juros, estaremos incrementando ainda mais o aumento do capitalismo selvagem em sua pior essência.

Não estou dizendo que o capitalismo é um sistema predador, mas se trabalhado somente em sua base das ciências exatas, certamente não teremos mudanças no comportamento da movimentação financeira e seus destinos que a mesma propõe, e acredite, sem dúvida corremos esse risco no universo financeiro, isso porque esses ensinamentos não trarão a verdadeira essência da Educação Financeira.

Essa essência é externada no conceito da Associação Brasileira de Educadores Financeiros – ABEFIN, segundo a qual: Educação Financeira é uma ciência humana que busca a autonomia financeira, fundamentada por uma metodologia baseada no comportamento, com o objetivo de construir um modelo mental que promova a sustentabilidade, crie hábitos saudáveis e proporcione o equilíbrio entre o SER, o FAZER, o TER e o MANTER, como escolhas conscientes para a realização de sonhos e necessidades.

Fazer com que esse entendimento chegue aos nossos líderes educacionais e também aos representantes de instituições financeiras foi e é bastante trabalhoso. Cuidar da implementação dos conteúdos adequados para uma verdadeira e real relação como o dinheiro é um desafio maior.

Destaco ponto de destaque para que esse conteúdo a necessidade de metodologias, como ocorrer ao ensinar matemática, português, geografia entre outros aprendizados no ensino básico, todos trazem metodologias próprias. A metodologia precisa ser também comprovada academicamente, o que vai muito além de controlar ganhos e gastos, trazendo o equilíbrio entre consumo, sonhos, desejos, necessidades e propósitos.

Caso isso não aconteça continuaremos correndo o risco de estarmos com a grande parte da população brasileira e suas famílias desequilibradas e altamente endividadas, incluo a este cenário os jovens que já no primeiro emprego são vítimas de um sistema de crédito voraz, levando-os muitas vezes à inadimplência, isso pela ausência desse conhecimento desde criança.

Por esse e outros motivos devemos sim levar para as salas de aulas dos estudantes, seja de escola pública ou privada, desde o ensino infantil esse saber, possibilitando o desenvolvimento cognitivo e comportamental para iniciar a transformação o quanto antes.

É preciso conscientização para construir um novo modelo mental que promova o entendimento do que o dinheiro pode representar em uma trajetória de vida, deixando claro como ele norteia a vida dos cidadãos. O dinheiro precisa ter e fazer novo sentido para todos, não somente sabendo controlar e potencializar com aplicações financeiras, mas também saber que o endividamento pode ser uma escolha saudável que se ensinado corretamente.

O mais importante é que na educação financeira se deve priorizar os recursos financeiros para as reais necessidades e em especial para os propósitos e sonhos, trazendo a tona o verdadeiros sentido da vida, possibilitando o equilíbrio entre o ser e o ter, garantindo nesse percurso de vida um comportamento saudável e sustentável financeiramente. Dito isso, apesar do caminho longo a percorrer, acredito que estamos sim no rumo promissor para o desenvolvimento dessa nova ciência

Reinaldo Domingos é PhD em Educação Financeira autor de coleções de educações financeiras para escolas, presidente da Associação Brasileira de Educadores Financeiros (Abefin) e da DSOP Educação Financeira. Autor de diversos livros sobre o tema, como o best-seller Terapia Financeira.

Você pode ler também